Todo dia é dia dos pais: é um clichê no qual acredito. No
entanto, não foi por isso que não postei uma foto com meu pai no último domingo,
não foi por isso que não escrevi coisas belas sobre a paternidade. Eu estava
pensando em outra coisa.
O meu pai é um típico amigão e palhaço, sempre tivemos uma
relação maravilhosa, apesar de nossos inúmeros defeitos. Desde pequena, eu o
vejo durante poucas horas do meu dia, mas isso nunca o impediu de estar
presente em minha vida, mesmo quando chegou atrasado. O meu pai sempre esteve
lá, porém, sinto muito em dizer que isso não o torna um herói. Isso faz dele um
pai; isso não o torna uma pessoa excepcional, contudo, alguém que honrou uma
escolha: a de ser pai.
No último dia dos pais era nisto que eu pensava: as obrigações
da paternidade. Pensava nisso enquanto lia as inúmeras declarações no Facebook,
que eram lindas, afetuosas e me pareceram sinceras; no entanto, havia uma coisa
que me incomodava, principalmente quando a homenagem vinha de uma mulher para
seu marido: a indicação de que ser um bom pai, um pai presente, carinhoso e amigo
é um mérito e não uma obrigação.
Os discursos citados contemplam a visão machista que
sobrecarrega a mulher de obrigações, principalmente quando se trata da
maternidade. Maternidade que, por vezes, lhe é forçada. Para que mais servem as mulheres a não ser para terem filhos?
Voltemos às obrigações: a mulher tem obrigação de cuidar de seus filhos, enquanto a ajuda masculina é louvada. A mulher deve educar as crianças, mesmo trabalhando fora, sendo dona de casa e professora particular dos filhos; já o homem deve trabalhar e descansar no tempo livre, caso o ele use seu tempo livre para ‘ajudar’ sua mulher a educar os filhos sua atitude é aclamada: ele é um bom pai.
Voltemos às obrigações: a mulher tem obrigação de cuidar de seus filhos, enquanto a ajuda masculina é louvada. A mulher deve educar as crianças, mesmo trabalhando fora, sendo dona de casa e professora particular dos filhos; já o homem deve trabalhar e descansar no tempo livre, caso o ele use seu tempo livre para ‘ajudar’ sua mulher a educar os filhos sua atitude é aclamada: ele é um bom pai.
E se ele não for nada disso? Ele é homem. Os homens são
mesmo assim. Você terá sorte se seu marido, namorado (atual ou ex) ajudar com
as crianças e isso será maravilhoso: ele é um homem contra a corrente, absolutamente incrível. Será?
Talvez essa reflexão, num dia em que as pessoas estavam
apenas preocupadas em homenagear (o que eu acho divertido e prazeroso), seja culpa desta busca por lucidez que dura faz algum tempo, fazendo
com que eu leia e ouça os diferentes discursos com atenção, sem nunca aceitá-los
prontamente.
Pode ser culpa deste tal feminismo que me fez enxergar as
mulheres que escolhem abortar (literalmente e não depois do nascimento), mulheres que não tenho condição de julgar, mas
que são julgadas o tempo inteiro, sem pena ou considerações. Talvez seja culpa desta percepção menos
distorcida das mães solteiras, as quais ouvem absurdos ao enfrentar a vida com
seus filhos nos braços. Os homens saem ilesos. A irresponsabilidade é uma marca
masculina e deve ser respeitada.
Talvez seja culpa do olhar mais atento sobre o meu lugar
no mundo, ou sobre o lugar que destinaram a mim. Talvez seja culpa da minha
reflexão sobre essa sociedade que transformou obrigações em qualidades. Afinal,
a honestidade, sinceridade e respeito tornaram-se atributos glorificáveis. Não
deveriam ser.
Meu pai, inclusive, diz não saber de onde tirei essas coisas
todas, principalmente esse tal de feminismo; às vezes, diz que sou
moderninha demais. Mal sabe que em todas as ocasiões em que ele disse “filha,
isso não é mais que minha obrigação de pai”, ajudava-me a construir a
percepção do meu papel como mulher, profissional, possível mãe; como ser
humano, como alguém que deve ter o direito de escolher o que quer e o dever de assumir suas responsabilidades.
Meu pai assumiu a responsabilidade que lhe cabia. Ele quis uma
gestação. Não abortou após meu
nascimento.
Meu pai não merece palmas por isso. Não merece campanha no Facebook
numa corrente “pró-vida”, numa exaltação de sua coragem.
Meu pai merece minha cumplicidade, lealdade, carinho e amor,
porque foi isso que sempre me deu.
Isso, meus amigos, não se chama exaltação. Chama-se retribuição.
Obs.: Meu pai chama-se Doriethison, ele, como já dito, cumpre seu papel de pai, por isso, pergunta se "é pavê ou pacumê". É um marido e sogro tão afetuoso quanto pai é. A ele agradeço por cada momento em que transcendeu seu papel de pai e foi tudo o mais que precisei.